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3 - Chegou a hora...




Deus ressuscita aquele que era considerado “o Maldito” pelo seu próprio povo, segundo a fé do seu próprio povo.
Jesus, com a sua vida, rompia todos os esquemas sagrados minuciosamente e muitas vezes de boa-vontade elaborados pelo ser humano.
Então, o próprio Deus quebra o “esquema” da morte, acolhendo a vida inteira de Jesus… o próprio Deus “diz” assim, por Paulo, que chegou o momento de “dar à luz” a Sua Filha chamada Humanidade, cuja Cabeça o próprio Deus gera assim em Jesus.
Este é o acontecimento mais importante da Humanidade, é aqui e só aqui que ela encontra o seu sentido pleno de existir, é neste momento que se dá como que o amadurecimento e nascimento do Sonho de Deus e do Seu Reino-Família.
Foi com uma belíssima preparação/construção participada com Deus aliado à Humanidade, em Aliança que isto foi acontecendo, como quem prepara uma surpresa, um presente para a pessoa mais amada de todas… assim é Deus com a Humanidade.

Com o inefável momento em que Deus levantou Jesus, quebrando o esquema de morte, que os mais íntimos de Jesus, os que o amaram (e não os guardas do sepulcro, por exemplo) testemunharam é que eles começaram a fazer uma “leitura” da vida do amigo e mestre que tinha estado com eles tão próximo… dezenas de anos depois tudo começa a fazer sentido e começam a entender…
… parece que ainda estamos nesta caminhada de olhar para trás e começar a entender, e começar a perceber o sentido de toda a vida deste nazareno ao ponto de, por mais que pensemos e falemos dele, nunca se esgota a descoberta e o encanto.
Hoje acredito que é possível experimentar o que experimentaram os “primeiros”… também podemos, hoje, ser desses “primeiros”, cheios de uma alegria contagiante e estranha, parecida com a alegria inebriante ao beber, a mais da medida, um bom vinho.

Como quem se vai afastando do “quadro” da vida de Jesus, vamos percebendo que é a parte central de um “quadro” maior, o do povo de Israel, o povo que intuiu a Aliança de Deus com o Seu povo (Mateus)…
Como quem se vai afastando um pouco mais do “quadro” da Aliança da qual nascerá Jesus vamos percebendo que essa Aliança era já uma preparação sonhada por Deus, inserida na própria Humanidade inteira, e não exclusiva do povo de Israel (Lucas).
Até ao ponto de nos rendermos e entendermos que não só a Humanidade, mas todo o Cosmos, toda a Natureza faz parte desta preparação amorosa e cuidada desde sempre por este Deus-Abba (João)…

De que maneira, de modo especial os escritos que foram fruto da reflexão de comunidades que lemos em Mateus (judeu) e Lucas (não judeu), mostram uma parte deste “quadro”?

Estes escritos procuram tornar evidente como a História chegou à sua maturação ideal, perfeita, para que o Messias chegasse… o Messias que é reconhecido em Jesus.
Jesus era assim como que o descendente, na fé, do grande Rei David… de modo que nele se cumpra o que já havia sido escrito que haveria de acontecer, no livro da Consolação, de Isaías, de onde nasce a esperança daquele, o Messias (ungido, abençoado por Deus), que há-de salvar o povo.

Na História do povo, houve um rei em Judá chamado Acaz que, perante a ameaça de guerra por parte de Damasco e Samaria, em vez de confiar no seu Deus, não pedindo o auxílio de outro rei, resolve associar-se ao imperador da Assíria. Este vence Damasco e Samaria, mas faz do povo seu vassalo. Então Deus, perante esta infidelidade (as infidelidades são simbolicamente descritas como uma prostituição do povo) do rei “diz-lhe”, através profeta Isaías:

“Deus mandou dizer de novo a Acaz:
«Pede ao Senhor, teu Deus, um sinal,
quer do fundo dos abismos, quer lá no alto dos céus.»
Acaz respondeu:
«Não pedirei tal coisa, não tentarei o Senhor»
Isaías respondeu:
«Escuta, herdeiro de David: Não vos basta já ser molestos para os homens, senão que também ousais sê-lo para o meu Deus?
Por isso, o Senhor Deus, por Sua conta e risco, vos dará um SINAL.
Olhai:
A jovem está grávida e vai dar à luz um filho,
e há-de pôr-lhe o nome de Emanuel.”

Is 7,10
Até os nossos "esquemas" de falsas modéstias, Deus quebra, para fazer o anúncio da Sua promessa... Não há nada que O impeça de dizer o Seu Sonho, de revelar o Dom, o Presente que está a preparar...
A jovem (almá, em hebraico) quer dizer aqui uma jovem não casada ou jovem senhora casada recentemente
. Emanuel quer dizer “Deus connosco”, Deus aqui. Historicamente esta jovem é a esposa do rei que estará grávida, e o profeta Isaías quer dizer que será a descendência do rei que trará aquele que há-de restabelecer para sempre a Aliança que o povo infiel teima em quebrar com o Deus sempre fiel. Esse Redentor libertará o povo porque o unirá verdadeiramente ao seu Deus.

Como dizer tudo isto, na História de Jesus?
Com uma genealogia.
A escrita simbólica de todos os homens e mulheres que haveriam de gerar e ser gerados até que se construísse uma teia, uma ligação desde Adam (todo o ser humano) e Abraão (o “Pai” da Aliança) passando por David até Jesus.
Usam-se genealogias, usam-se números… coisas que nesta cultura são símbolos fortíssimos e, por isso, muito evidentes.
Percebemos que, comparando as genealogias de Mateus e Lucas, estas são artificialmente construídas porque não coincidem uma com a outra… e nem se preocuparam que coincidisse. Claro!
O objectivo não era a elaboração de uma descrição histórica-científica exacta… mas a transmissão de uma mensagem muito mais profunda e importante.
É Deus que está aqui, e podemos não saber muito bem como foi… mas é bom e faz sentido acreditar que sim. Jesus é o Messias que Deus prometeu ao seu povo.

O “quadro” da genealogia de Mateus é belíssimo porque ao longo da sua escrita lemos a repetição do número 14 (que é a duplicação de 7… o número da perfeição, o número que é usado para dizer, por exemplo, a perfeição do tempo que Deus demorou a “fabricar” o mundo com as Suas mãos (Génesis)… a Humanidade que é criada ao 6º dia, quase perfeita porque a caminho do 7ºdia, o dia em que Deus está porque “repousa” da Criação feita por Ele, é lá que Ele está, na perfeição).
O número 14 é repetido, na genealogia de Mateus, três vezes.

Na língua hebraica não existem algarismos como existem na nossa cultura. As próprias letras do alfabeto hebraico associam-se a algarismos.
E, como em hebraico, só se escrevem as consoantes, para um judeu é imediata a leitura da soma do número DaViD (14 = “D” correspondente ao 4 + “V” correspondente ao 6 + “D” correspondente ao 4).

Três vezes 14 gerações…
A primeira geração, de Abraão até David, no final da qual se atinge assim o auge da fé e da Aliança do povo com Deus.

A segunda geração, de David até ao cativeiro da Babilónia, no final da qual se atinge assim o ponto mais baixo e vergonhoso da infidelidade à Aliança com Deus.

A terceira geração, da Babilónia até ao Messias, no final da qual se inicia o ponto máximo de toda a História da Salvação, porque a Aliança foi para sempre restaurada, Deus está com o povo, e o povo “nasce de novo”, caminha para Deus.

Nesta genealogia, Mateus insere 4 mulheres… todas elas com má fama.
Tamar (Gn 38,1-30) e Raab (Js 2;6,17.22) foram Prostitutas.
Betsabeia, mulher de Urias que se casará com David era, por isso, considerada Adúltera (2 Sm11,3:1Cr3,5).
Rute era pagã (Rt 4,12).
Isto diz-nos que o Messias assumiu, foi gerado, teve como mãe uma Humanidade com tudo o que tem de melhor e pior… e é toda ela que o Messias resgata, reata com Deus... ninguém fica de fora.

E ficamos por aqui, hoje… no próximo post, partilho aqui o belíssimo tema da geração virginal de Jesus, que infelizmente nem sempre é bem entendido…

Até já…

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