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|5| Porque te amamos e queremos dizer-te, Jesus, chamamos-te SENHOR

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As primeiras comunidades de discípulos de Jesus, desde cedo, foram intuindo que o nazareno Jesus não era apenas aquele que foi crucificado e levantado da morte pela mão de Deus… para eles já era mais que isto.
Sentiram necessidade de afirmar que o nazareno Jesus, por causa da sua vida e da confirmação plena por parte de Deus, é aquele que tem autoridade e poder… é o Senhor, não existe nenhum outro Senhor como ele.

Afirmam então a presença viva e actuante de Jesus vivo na comunidade de discípulos.
Afirmam então a presença viva e actuante de Jesus vivo em tudo o que existe.
Afirmam então a relação única e íntima dos discípulos com Jesus.
Afirmam então a relação única e íntima entre o nazareno ressuscitado e o próprio Deus, e tal como Deus está a “trabalhar”, a actuar em tudo o que existe, também o Senhor, o nazareno ressuscitado continua a trabalhar e a actuar em tudo o que existe porque ele é UM com Deus.

Dizê-lo “Senhor”, hoje, é designar ou significar a nossa relação/atitude diante dele?
Ou seja… Dizê-lo “Senhor” será atribuir-lhe ou reconhecer-lhe um título de merecimento ou será afirmar quem ele é na nossa vida, na nossa humanidade, em tudo o que existe?

A expressão “Senhor” aparece muitas vezes, nos Evangelhos, nos relatos de seguimento.
Dizê-lo “Senhor” desta maneira é como ver nele a autoridade para escolher e chamar discípulos para que o sigam (numa cultura em que normalmente acontecia o contrário, ou seja, aquele que queria tornar-se discípulo é que escolhia para si um rabi, um mestre, um sábio. Com Jesus, já sabemos, estas lógicas e atitudes são sempre totalmente diferentes)
E seguem-no porque nele encontram sentido e missão para as suas vidas.

Este título dado a Jesus poderá ter naturalmente influências da época. Aqueles que sofriam (a grande parte do povo) esperavam uma salvação, esperavam um salvador… E isto esperava-se de quem detinha o poder sobre o povo. Só de quem tinha algum poder é que se podia esperar alguma mudança, alguma esperança.
Entre os romanos e os gregos, “Senhor” diz-se com a expressão Kyrios e é um título atribuído ao imperador e às divindades pagãs, então, as primeiras comunidades de discípulos de Jesus começaram a sentir que estes títulos máximos só tinham sentido nas suas vidas aplicados ao nazareno ressuscitado.
Temos hoje escritos destes tempos em que os cristãos eram forçados a confessar “Kyrios César” e a renegar a Cristo. Muitos cristãos foram martirizados porque se recusaram a negar Jesus desta maneira. Porque seria isto tão incómodo para os romanos ou escandaloso para os gregos?
Porque seria tão incómodo afirmar como “Senhor” a um nazareno diante do imperador romano?
E ninguém que me lê será ingénuo ao ponto de não concordar que hoje temos muitos “Césares” em tudo o que existe. Porque é que quem se diz cristão, hoje e agora, já incomoda tão pouco diante dos “Césares” que se apresentam diante de nós?

É que não era mero capricho de chamar nomes bonitos a este ou àquele. Há muito mais aqui em jogo.
Dizer “Kyrios Iesous” (Senhor Jesus) resultava em conflito e perigo porque este senhorio era afirmado com atitudes, sinais e gestos concretos de justiça, fundamentais para tornar presente o Reino de Deus (missão fundamental de todo o discípulo de Jesus). E aqui era preciso “lutar” contra todos os Senhores que quisessem ocupar o lugar do Senhor Jesus, nas vidas de todos.

E cito Jon Sobrino que o diz bem melhor que eu:
“… o conflitivo não é o título, proclamando publicamente Jesus como Kyrios, mas comportar-se social e eticamente de acordo com Jesus de Nazaré. Isso mostra o próprio facto de que mesmo antes do uso público – e provocador – do Kyrios, os cristãos tenham sofrido perseguição no seio das famílias e dentro do seu próprio povo judeu. Só depois vieram ataques e perseguições dos poderes políticos romanos.”

e diz ainda R. Aguirre:
“… uma atitude cristã coerente há-de manter sempre uma certa capacidade crítica para com o seu meio social e não deverá estranhar por ter que assumir o conflito.”

Mas, ao mesmo tempo que deverá ser, no concreto dos dias de todos os discípulos de Jesus, uma afirmação conflictiva, é também uma afirmação de esperança. É o sinal forte de que nenhum poderio nos poderá esmagar debaixo dos seus pesos.
É que este Senhorio, este poder, esta autoridade que reconhecemos no Senhor Jesus não é imposição, é antes um mostrar claramente qual o caminho para agir de um jeito que sirva para construir comunidade. É em comunidade, com líderes carismaticamente reconhecidos, que os discípulos de Jesus vão intuindo esta inspiração e capacitação para se irem configurando (tomando o mesmo olhar, o mesmo rosto, as mesmas atitudes, o mesmo fervor) de Jesus.

Proclamar Jesus como “Senhor” é dizer que o seu Senhorio, na História, não é exercido por nenhuma comunidade, nem mesmo pela Igreja como instituição… só Jesus é o Senhor. É por este motivo que, até mesmo dentro da Igreja/instituição pode haver conflitos resultantes das tantas formas de afirmar que só Jesus é o Senhor.

Jesus é o Senhor, não ao jeito dos senhorios que conhecemos, é antes o escândalo do Senhor que serve, e do Senhor que serve ao ponto de ser crucificado… os evangelhos dizem-nos então que não é qualquer um que é Senhor, mas sim aquele que se baixa para “lavar os pés”.
O seu poder não se impõe, não desfigura, nem desumaniza… pelo contrário. Não manipula a História, antes vai inspirando nos seus discípulos atitudes concretas de justiça a assumir… dando já vida deste modo. E não só inspira mas está presente em tudo o que existe através dos seus discípulos de todos os tempos, ficando assim como que entregue a eles.

Diz ainda Jon Sobrino: “Comunidade, Igreja e mundo não são só apenas lugares de presença de Cristo, mas sacramentos da sua realidade e instrumentos da sua actividade”, ainda que a iniciativa seja sempre do Espírito que anima todo o corpo que os discípulos formam com Jesus/Cabeça deste corpo.
É a grande comunidade de discípulos de Jesus que pode fazer este Espírito gerar frutos de justiça e esperança. É o concreto das nossas vidas que afirma o Senhorio de Cristo.

Deixo a pergunta no ar…
No centro das nossas vidas e em tudo o que fazemos, aí Jesus é o Senhor?

e deixo também este Senhorio dito e vivido por Paulo…
1Cor 7,22: “O escravo que, no Senhor, foi chamado, é um liberto do Senhor, tal como o livre que foi chamado, é escravo do Senhor.”

1Cor 9,1: “Não sou eu, porventura, livre? Não sou apóstolo? Não vi Jesus, nosso Senhor? Acaso, não sois fruto do meu trabalho, no Senhor? Se para outros não sou apóstolo, certamente o sou para vós; porque vós sois o selo do meu apostolado, no Senhor.”

Fl 3,1; 4,1-4: “Alegrai-vos, no Senhor (…) Sede firmes, no Senhor”

1Ts 5,12: “Pedimo-vos, irmãos, que respeitem aqueles que trabalham entre vós, ou seja, aqueles que no Senhor vos ensinam e vos guiam. Tratem-nos com o maior respeito e amor, por causa do trabalho que fazem.”

Rom 14,8: “Se vivemos, é para o Senhor que vivemos; e, se morremos, também é para o Senhor que morremos. Assim, tanto se vivermos como morremos, somos do Senhor. Pois Cristo morreu e viveu de novo para ser o Senhor tanto dos mortos como dos vivos.”
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1 comentário:

Anónimo disse...

é profundo ,...
graças pela partilha.