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11... Jesus... Yeshuah, o homem livre, sinal de provocação


Yeshuah era um homem livre, e os homens livres sempre inquietam e deixam perplexos os que têm algum poder de qualquer espécie, em qualquer tempo.
Enquanto Yeshuah andava de aldeia em aldeia, os poderosos não viam nele nenhuma ameaça pois estes eram uma minoria que vivia à volta do Templo de Jerusalém, e a que não tinham nem lhes interessava ter, adeptos entre o povo das aldeias…

Era com os fariseus que havia já algum confronto, ainda que os evangelistas o descrevam assim, talvez os debates com Yeshuah não tivessem sido tão acesos quanto o foram mais tarde entre os fariseus e os seguidores de Yeshuah… época em que foram redigidos os evangelhos.
Os fariseus moviam-se no meio do povo. Na época procuravam nele ganhar valor, para fazer crescer a sua posição, prestígio e influência.
Os fariseus eram um grupo de pessoas que sabia ler e escrever e estavam muito familiarizados com as tradições e os costumes de Israel.
Alguns seriam escribas, outros educadores, outros subordinados às classes que governavam.
Eram eles que zelavam para que o povo não esquecesse as suas tradições e se certificavam que Israel continuava fiel ao Deus Santo que lhe havia oferecido a Aliança e a lei. Para isso aprofundavam o estudo da Torah (o livro da lei) cumprindo-a e fazendo cumpri-la escrupulosamente.

Yeshuah, que só falava sobre o Abba e a lógica do Seu Reino, não poderia passar despercebido diante deste grupo “especializado” na lei que acreditavam ser de Deus.
Alguns deles acreditam também, por exemplo, na ressurreição final mas, o que mais os desconcerta é o modo como Yeshuah entende a lei. Irrita-os a sua pretensão de falar de Deus e actuar em nome dEle, com autoridade própria, não “oficial”, sem ter nunca seguido nenhum mestre.
Enquanto os mestres e doutores se centram e se esforçam por interpretar, explicar e actualizar a vontade de Deus expressa na lei e nas tradições, Yeshuah insiste mesmo é em comunicar a sua própria experiência de um Deus que é Pai.
Para Yeshuah o que mais importa não são as leis, mas escutar o chamamento que Deus faz para entrar no Seu Reino, promovendo agora uma vida mais humana para todos.

Os fariseus ficavam perplexos como Yeshuah se sente amigo mesmo daqueles que vivem fora da Aliança sem mostrar sinais de arrependimento, sem os conduzir à penitência e aos sacrifícios exigidos a todo o pecador afastado da lei.

Os fariseus discutiam entre si, muitos o admiravam, outros colocavam as suas palavras em causa e tentavam desacreditá-lo diante do povo.
Mas não foram os fariseus aqueles que tramaram a sua condenação à morte.

A verdadeira ameaça surge depois, da aristocracia sacerdotal e laica de Jerusalém, e da autoridade romana.
Eram considerados pelo povo como um sector poderoso e corrupto que vivia dos dízimos (a décima parte dos frutos da terra), taxas e doações que chegavam ao Templo de todas as mais longínquas comunidades de judeus. Os cofres do Templo enchiam-se de riqueza, porque com o domínio do império romano entrou em Israel a moeda de troca, e assim já era possível armazenar muita riqueza.
Para manter a ordem, tanto no recinto do Templo, como em Jerusalém, possuíam uma polícia exclusiva.
Quando lemos a expressão “sumos-sacerdotes”, nos evangelhos, refere-se ao sumo-sacerdote em exercício juntamente com aqueles que exerceram esse cargo no passado e outros responsáveis por serviços importantes como o comandante do Templo ou o responsável do Tesouro.
Não eram uma autoridade exclusivamente religiosa, também exerciam algum poder político, intervinham em litígios surgidos entre o povo e aplicavam as leis de Israel, unidos ao prefeito romano que era quem os escolhia ou dispensava do cargo.
Roma somente defendia as fronteiras, mantinha a sua “pax romana”, cobrava os impostos e podia ditar sentenças de morte.

O maior perigo para Yeshuah vinha de quem tinha o máximo poder. É que Yeshuah usa como símbolo central do seu anúncio um termo político… proclama a chegada do reino... do “império de Deus”.
E em tudo o que fala, sobre a vontade de Deus, está em contradição com a de César.
Yeshuah apresenta a sua visão crítica da situação, a sua urgência de solidariedade para com os excluídos e a sua liberdade representam uma perigosa alternativa ao sistema imposto por Roma.
E o seu anúncio também não se centra na lógica do Templo.

Yeshuah não era ingénuo. Sentia diante de si a possibilidade de um final violento, tal como o teve João, o baptista que ele mesmo seguiu.
Era perigoso defender os pobres, os últimos, os que eram considerados “resto”, os "sujos", o “lixo” da sociedade. Era impossível promover e mostrar a proximidade do Reino de Deus como um projecto de felicidade para os excluídos, um projecto de justiça e compaixão, sem que provocasse irritação e fosse perseguido por aqueles a quem não lhes interessava nenhuma mudança, nem no Império, nem no Templo.

Mas ele não procurava o martírio.
Nunca quis o sofrimento nem para ele, nem para ninguém… não é esse o objectivo da sua vida.
É uma ideia que soa estranha para muitos de nós… mas é mesmo isto.
Estamos demasiado habituados a ouvir que “Jesus quis sofrer a morte para nos salvar dos nossos pecados e assim nos conduzir a Deus”… como se ele se tivesse atirado para o sofrimento e para a morte, com um sorrisinho nos lábios, como nos mostram tantas películas de cinema, que distorcem e tiram dignidade ao verdadeiro homem inteiro que Yeshuah é.
O sofrimento é uma coisa má, e ele dedicou a vida inteira a combater as causas de todo e qualquer sofrimento. Ele não aceitou resignado o martírio, como quem baixa os braços diante do inevitável, como se isso fosse a vontade do Seu Deus… NUNCA FOI!...
Recuso-me a acreditar num Deus que deseje o sofrimento de alguém.
“Se nós, que somos maus, damos coisas boas aos nossos filhos, quanto mais o Pai…”
Se nós somos incapazes de fazer mal aos que amamos… quanto mais Deus, que não deseja jamais o sofrimento de ninguém… ou conseguiremos ser melhores que Deus?...

Se Yeshuah não virou costas, nem fugiu da perseguição e do martírio é porque isso é a consequência das opções fundamentais que seguiu na sua vida, denunciando a injustiça, e, pela sua fidelidade ao projecto de Deus-Abba-Pai que não quer o sofrimento para ninguém.
Ele não fugiu das ameaças, nem se calou diante dos poderosos irritados com a sua atitude insolente.
Continuou o seu caminho…
E não me venham com a história que, se Yeshuah era Deus, então sabia que ia sofrer, e por isso não pode ter assim sofrido como qualquer homem teria sofrido no lugar dele.
Yeshuah era inteiramente homem… e, inteiramente Homem, aceitou as consequências do seu anúncio.
Preferiu morrer a calar-se atraiçoando a missão da sua vida inteira.

Iremos vê-lo a subir a Jerusalém como o terá feito tantas vezes por ocasião das festas.
Iremos vê-lo a ensinar, à entrada do Templo, lugar onde se juntava muita gente…

1 comentário:

Rui Vasconcelos disse...

É verdade, Anawim, que quando perdemos o horizonte do Reino e a consagração pelo Espírito, frases como "pegar na sua cruz e seguir-me" ou "quem perder a sua vida encontra-la-á" perdem o seu horizonte: a entrega pelas causas da justiça, junto dos anawim, uma nova lógica de relações, os critérios de vida do Homem Novo, contrários ao egoismo, poder e possuir.

É esse o sofrimento precioso aos olhos de Deus, ou seja, fecundo. Não as penitencias intimistas ou a aceitação passiva das causas de injustiça.

Então, torna-se um apelo de Jesus aos discípulos, à Igreja, essa entrega pelo Reino, em vez de ser um slogan tantos séculos pregado aos simples que enchiam as igrejas.

Um abraço!