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2 - Levanta-te, vai...



Volto ao tema sobre Jonas que deixei em aberto AQUI.

Este livro, como já disse, quebra todos os esquemas habituais usados em todos os outros livros do Antigo Testamento.
O seu autor não tinha a mínima intenção de relatar factos históricos, por isso, todas as personagens e elementos deste livro não precisam de ser reais.
O objectivo aqui pretendido é uma afirmação muito importante, como veremos.

No livro fala-se da cidade de Nínive, que foi capital do grande império Assírio, ficava a oriente de Israel; Jafa, (actual Tel-Aviv) uma cidade de Israel, que era um importante porto de mar; Társis que fica no extremo ocidental (talvez a última cidade conhecida do lado do ocidente… no “final do mundo”)
Nínive, capital da Assiria, representava tudo o que um bom israelita deveria odiar. Representava a capital de um povo que subjugou e exilou o povo de Israel. Os Assirios eram chamados de pagãos… como, aliás, todos os outros povos, somente aqueles que tinham sangue hebreu e adoravam o Deus único é que eram o “povo eleito” por esse mesmo Deus.

A personagem central e único hebreu mencionado em todo o livro chama-se Jonas… um nome hebraico que significa pombo, naturalmente escolhido não por acaso. A característica fundamental deste animal, como sabemos, é a mansidão… tão manso que quase se deixa apanhar pela mão humana…
… mas não tanto pela “mão” divina pois, quando o relato conta como era interpelado pelo seu Deus, para que fosse anunciar como Deus estava atento à maldade da grande cidade, Jonas decide friamente seguir viagem, sim, mas exactamente no sentido contrário ao que lhe foi proposto, o destino que ele mesmo havia traçado para si era o mais longínquo extremo oposto, digo friamente porque o autor se dá ao trabalho de relatar todos os pormenores de uma viagem que foi pensada com tempo.

É tão bonita a maneira com que o autor intui o jeito de Deus “se meter” com os seus escolhidos para alguma missão… Disse a Jonas: “Levanta-te, vai…”
Há traduções que dizem até de outro modo: “Predispõe-te, vai…”
E em toda a narração vemos como este primeiro pedido, Jonas não o soube assumir bem.
Jonas é de facto um escolhido por Deus para lhe dar a missão de um anúncio mas, curiosamente, não aparece em todo o relato o termo “nabi” que significa profeta… não se encontra no relato nenhum oráculo ao jeito dos habituais livros dos profetas que falam em nome de Deus. Faz-nos pensar que aqui está representado o próprio Israel inteiro que não é composto somente pelos seus profetas, mas todo o povo. Muito ao contrário até dos habituais oráculos não encontramos Jonas a proferir uma única prece ao seu Deus (com bons modos… eheh). A oração que Jonas faz dentro do grande peixe é escrita num estilo tão diferente que se entende que é um acrescento posterior ao relato original (e nem se enquadra muito bem no temperamento que vamos lendo deste hebreu).

Jonas resolve não assumir a missão que o seu Deus lhe confia, mas os planos de fuga não lhe correm muito bem.
O perigo de uma tempestade no mar pode levar à morte tanto a Jonas (que pertence ao povo eleito) como aos marinheiros (pagãos, adoradores de outros deuses).
De facto, usando esta expressão que tão bem conhecemos: Estão todos no mesmo barco.
Diante da possibilidade da morte, desfazem-se de bens que possam estar a pesar demasiado no barco. Jonas demite-se de tudo o que está a acontecer sem sequer desesperar e, estranhamente calmo, ou porque tinha pouca vontade de lutar pela vida (que é o que acontece com tem não tem objectivos, metas a atingir), ou talvez porque conhecendo o seu Deus, estivesse confiante que Este o livraria da morte, e deita-se a dormir… a dormir profundamente. Há traduções deste relato que dizem que ele até roncava, tão profundo era o sono.
Mais uma vez aparece um pedido feito a Jonas, desta vez, pelos marinheiros que apesar de assustados com a situação, até são simpáticos. E o próprio capitão, estranhando a sua quieta atitude lhe diz: “Levanta-te, invoca o teu Deus…”
Não vemos Jonas a orar ao seu Deus… mas encontramos os marinheiros, pagãos, a orarem ao Deus de Jonas, quando este lhes disse que era por estar a fugir dEle que tudo aquilo estava a acontecer, por Lhe estar a ser infiel.
Parece que, sem querer, Jonas acabou por converter os marinheiros à fé neste “Deus do Céu, que fez os mares e a terra”. E Deus é tão maior que a infidelidade do seu “escolhido”.

Depois continuamos.
Deixem-me só dizer-vos que temos tanto deste hebreu dentro da nossa própria fé, que já é iluminada pela presença do Nazareno Ressuscitado e animada pela presença da Ruah de Deus.

Este relato… esta personagem, expressa tão bem algumas realidades que se vivem em tantas paróquias, em tantos movimentos eclesiais, em tantas situações em que a nossa fé “é coisa só de nós e só para nós”… dá que pensar…!

1 comentário:

José A. Vaz disse...

ui,como eu te compreendo em relação ao último parágrafo...shalom.